Josué e Pedro atravessaram o buraco na cerca enquanto Olívia observava se não apareceria alguém. Embora temessem a Senhora Tânia, estavam dispostos a pegar o bolo de maçãs que ela colocara na janela para esfriar. Josúe e Pedro eram irmãos e tinham os olhos esbugalhados como se estivessem sempre famintos. Olívia era a prima de menor idade, carregava sempre consigo uma boneca de pano que trazia na cabeça um laço de fita azul celeste igual ao que ela usava.
Senhora Tânia, como era chamada pelos poucos vizinhos que a cercavam, tinha um pomar de maçãs, romãs e pêras asiáticas. Mas sua fruta favorita é a maçã. Em todas as manhãs de outono, a Senhora Tânia se levantava cedo para colher os deliciosos frutos da macieira que virarão saborosos bolos ao toque de suas habilidosas mãos.
A Senhora Tânia colhe delicadamente 4 frutos. Escolhe-os pelo tamanho, cor e cheiro. Apanha as mais vistosas, cheirosas e suculentas frutas. Acomoda-as em seu avental de courvin e levava-as para dentro de casa. Em sua cozinha ladrilhada de vermelho descasca as 4 maçãs colhidas e tritura as cascas com 4 ovos e uma xícara de óleo vegetal. A polpa é cuidadosamente picada em cubos que são misturados à duas xícaras de farinha, outras duas de açúcar e uma colher de fermento. Tudo junto num belo tabuleiro redondo a Senhora Tânia deixa assar por minutos tão saborosa obra. Enquanto assa o bolo ela pila em seu quintal o café plantado, colhido e torrado ali mesmo. Só quem entende de bolos e maçãs é capaz de perceber o adocicado do café recém pilado.
Enquanto colocava para ferver a água apanhada da última chuva para coar o café, Pedro, Josué e Olívia, espreitavam pelos buracos da cerca da casa da Senhora Tânia cada movimento, cada etapa da feitura de tão esperada quitanda na ansiedade de ver o bolo ser colocado para esfriar na janela da cozinha, aguçando ainda mais seus olfatos. Se tivessem um pouco de sorte até poderia ser que aquela velha senhora lhes ofereça uma fatia daquele delicioso bolo. Nem precisava do café, apenas o gosto assado das maçãs em suas pequenas bocas infantis já era motivo de grande alegria. Mas como sabiam que isso não aconteceria, hoje, resolveram apanhar o bolo sem a condescendência daquela mulher.
Embora resolvidas, as crianças nunca entravam no quintal daquela mulher. Os pais eram rígidos quanto a esta proibição. Os meninos temiam a severidade dos pais, Olívia se arrepiava só em imaginar os insetos que habitavam o quintal daquela casa. Mas o que eles não admitiam era o que realmente os amedrontavam. Desde que a Senhora Tânia se mudara para aquele pequeno vilarejo crianças que eram atraídas pelo doce cheiro do bolo de maçãs, cuidadosamente colocados na janela para esfriar, desapareciam na tentativa de alcança-lo. Estas são histórias que as crianças muito temiam. Embora não houvesse confirmações ninguém queria correr o risco de desaparecer.
A casa da Senhora Tânia era rodeada por um imenso quintal com todos os tipos de plantas e flores. As outras mulheres atribuíam essas plantas aos seus poderes de bruxa, os homens acreditavam se tratar de uma dona louca apenas. O que ninguém podia negar era o fato de haver muitas plantas carregadas de significados que ali, naquele quintal, eram cultivadas. O pé de funcho, as calêndolas, trevos, verbenas, açafrão, manacá, camolila, erva de Sã o João, crisântemos e uma belo abrunheiro. A própria Senhora cuidava com muito afinco de todas as plantas, embora suspeitavam que ela exterminava todas as joaninhas de sua propriedade, fato que justifica o grande número de pulgões existentes naquelas plantas. Pulgões e outras tantas variedades de bichos que deixavam Olívia amedrontada. O manacá estava sempre rodeado de larvas. Os crisântemos cheios de lagartas. Grilos grandes e marrons por toda a parte e aranhas sobre todas as romãs. E ainda era possível encontrar formigas cortadeiras, rãs brejeiras, moscas varejeiras e cigarras cantadeiras.
Por estes motivos a Senhora nunca recebia nenhum tipo de visita. Mesmo seus bolos espalhando um saboroso cheiro por toda a vila, ninguém se atrevia entrar em seus domínios. Ainda havia as histórias das crianças desaparecidas. Verdade ou não, era melhor evitar o contado com aquela mulher estranha. Porém, Pedro e Josué estavam dispostos a atravessar aquelas cercas e pegar o bolo inteiro para eles. Ora! A Senhora Tânia tem maçãs suficientes em seu quintal para fazer quantos bolos queira, por isso convenceram Olívia a vigiar o buraco que abriram para adentrar no quintal e seguiram em direção à janela.
Neste dia, como em todos os outros, a Senhora Tânia se sentou confortavelmente em sua varanda para mais um café com seu saboroso bolo de maçãs que exalava um suculento cheiro por toda a vizinhança. Tânia enquanto toma se café observa cautelosamante toda a vida existente em seu jardim. Observa cada planta, cada flor, cada um dos insetos residentes ali, incluindo os três novos moradores: Dois ratinhos magricelas com grandes olhos esbugalhados e famintos e uma linda rãzinha de laço de fita azul celeste na cabeça que ela delicadamente a batizou de Olívia.
Mano,
ResponderExcluirestas estórias me encantam desde muito tempo, mas muito mesmo, desde quando eu era criança.
Li com agrado.
Walmir
http://walmir.carvalho.zip.net
ADOOREI a historia..
ResponderExcluireu acho que Sra. Tânia deveria dividir seu bolo de maçã com as crianças.. porque coitadinhas ficam aguadas! kkkkkkkkkkkkk
Vô fazer o bolo! *--* (delicia)
Pois cheirou aqui esse bolo. Deu vontade de atravessar a cerca para rouba-lo também. Delicioso texto. Beijos.
ResponderExcluirImagino que prazer a Sra Tânia teria em receber tantos convidados para saborear o seu bolo. Ou ser saboreados? Cá em nós, não sei bem. Mas pintou uma grande curiosidade: Quem ensinou a sra Tânia tais habilidades? Não me refiro a fazer bolos, é claro!!!
ResponderExcluirVou anotar a receita.. E é bom funcionar... ou quem vai virar sapo, é o SR escritor que fez vontade nos leitores... Dai ja sabe ne?! teremos o prazer d juntar Olivia a Renatto e dizer: Geeeeeeenteee q liiindo um casal de saaapos!
ResponderExcluirAdorei!
Realmente, deu vontade de saborear tão prazeroso bolo. Preparado com tão cuidado deve ter um sabor inesquecível mesmo.
ResponderExcluirMuito bom o texto amigo. Parabéns!
Luiz Eduardo S.Marques