segunda-feira, maio 25, 2009

Conto - Quando nos casarmos

Sei que quando nos casarmos, você me levará para ver o mar. É uma vontade antiga que carrego comigo desde menina e você, para me fazer feliz como todo bom marido, se sacrificará para realizá-la. Assim que nos desposarmos num sábado pela manhã de um dia de maio, onde o outono suaviza o calor de abril e as folhas das árvores darão um charme em meu caminho até o altar, vou ter a certeza que você me levará para conhecer o mar.
Carrego comigo essa vontade desde menina, deitada às margens dos rios, olhando suas águas descerem lentamente em direção ao mar. Meu pai sabia que meu olhar perdido logo atiçaria minhas vontades. Ele sempre dizia que as mulheres eram feito o mar: ‘Mudam conforme a lua e o vento é capaz de transformá-las’. E assim eu era, como as águas das chuvas que desciam pela vidraça de minha casa, assim como as enxurradas que passavam em frente ao meu portão e se encaminhavam para o rio e logo em seguida o mar. Por isso a minha vontade, ainda menina, era ser chuva.
Nesse tempo, disse a meu pai que queria conhecer o mar, lembro-me de sua voz dizendo: ‘deixo para que seu marido a leve logo após se casarem’. Disso eu já sabia. Minha mãe, também quando menina, quis conhecer o mar. Como todas as mulheres ela quis descer os rios e ser levada até o mar. Por isso, seu pai tratou logo de casá-la para que seu marido a levasse ao mar. Meu pai sabia das coisas e sabia que essa vontade também me acometeria, por isso tratou logo de me trazer você.
Tem sido assim por muito tempo e nós casaremos por uma vontade antiga das mulheres da minha família. Num dia de maio, bem sei. Eu vestida de branco caminhando sobre as folhas que outono despejará sobre meu caminho. O caminho que me levará até você. Então nos veremos felizes e com um sorriso ansioso assentiremos um com o outro.
Depois, eu já não sei, quando voltarmos teremos que nos esforçar para nos amar, para nos conhecer, para o resto da vida. Depois desse dia não sei mais o que será. Uns dizem que o mar transforma as pessoas. Talvez as mulheres, os homens não sei. Umas voltam felizes, outras nem tanto. Já ouvi dizer de mulheres que nunca voltaram. Ficaram pelo caminho. Por isso, tento não me preocupar com a volta. Em como será quando estiver em nossa casa e nossos filhos chegarem, um após o outro, e nós dois já transformados pela brisa não teremos mais com o que sonhar.
Mas não quero que se entristeça por isso. Não agora. Daqui a um tempo, quando estivermos bem velhinhos e sentados na varanda de nossa pequena casa olharemos nossas velhas fotos, nos lembraremos do mar, do seu cheiro, de sua brisa e da certeza que tínhamos quando, felizes, caminhávamos de mãos dadas pela areia.

5 comentários:

  1. Renatto! Adorei o texto.. como sempre,nhe ?
    MAs de verdade... esse realmnte está OTIMO!
    *-*'
    beejo

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  2. Ler seus textos é como ver uma pintura em tela... Conceguimos enxergar e sentir cada onda, cada folha que cai no outono,cada brisa... Sem palavras pra explicar o que se sente ao ler o que voce escreve... Algumas pessoas,de fato, NASCEM para escrever... e para pintar... Adorei!! Gabyzinha do Fulo

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  3. Caramba. Você é muito bom. Parabéns pelos belos textos, que nos fazem sonhar. Como brisa do vento, como o sopro do mar.Muito lindo.
    Um abraço fraterno,
    Marcos Vinícius.

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  4. Eu senti vontade de ser a enxurrada
    E senti vontade de ser a agua do mar
    Acredito que o vento também me tranforme
    E só porque ainda "sou menina" quero também ser chuva...
    vou fazer um post desse trecho no meu blog!!!
    Preciso falar que adorei?

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  5. Andrea, não precisa dizer mais nada... obrigado pelas palavras, aliás a vocês que comentaram e aos que não comentaram, mas vieram me falar que leram, meu sinceros agradecimentos.

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